domingo, 19 de octubre de 2008

Mate rio-grandense.

(...) Só um pouco de erva. A velhinha foi até o armário de portas envidraçadas, torceu a chave e tirou lá de dentro uma grande lata quadrada. Depois de calcular a quantidade pelo peso, recolocou-a no lugar e fechou novamente a porta.
- Tem menos de um quilo.
- Economizando bem a gente ainda tem erva para duas semanas.
A velhinha retornou ao crochê de lã preta que desenrolava de um grande novelo, engaiolado numa cesta de largas tiras de vime, e que resultara no desfazimento de um velho pulôver. No início do verão ela transformava o pulôver em novelo de lá, e mal o outono chegava a meio, as suas mãos lentas recomeçavam a tecer com paciência. Então ela disse:
- Pena que a gente não possa fazer com a erva o que se faz com a lã.
- Se pode – disse ele sem olhar para a mulher. – O meu falecido pai, na Revolução de 93, junto com mais três companheiros, tomou mate durante um mês inteiro só com um quilo de erva. Depois do chimarrão a erva era colocada num papel e ficava exposta ao sol até ficar bem sequinha. No dia seguinte bastava misturar nela um pouco de erva nova para que o mate corresse a roda.
- Um mês com um quilo de erva! – exclamou a velhinha, incrédula.
- E mais duraria se o inimigo não encontrasse os três no esconderijo e não tivesse passado pelas armas os dois amigos do meu pai. Só pouparam o velho, porque um dos irmãos dele era capitão dos maragatos, portanto merecia misericórdia.
- Já ouvi esta história tantas vezes que até sei tudo de cor.
O velho fez um sinal de enfado. Ela vivia dizendo que conhecia todas as suas histórias. Repetiu a frase de sempre:
- Pudera. A gente está casado há mais de sessenta e oito anos.
- Como se eu não soubesse – disse ela, sempre tricotando. – Dia 10 de março de 1910. Santana do Livramento. Com festa do lado uruguaio, em Rivera...
- Taquarembó – corrigiu ele.
- Isso: Taquarembó. Na chácara do falecido Dom Pepe de Aguilar y Aguilar, nosso padrinho de casamento.
- Que morreu no ano seguinte, de tiro.
- Coitado.
- Coitada é da Dona Mercedes que ficou com doze filhos para criar.
- Naquele tempo até que nem era difícil.
- Lá isso é verdade. Mas, sem querer mudar de assunto: a gente bem que podia tomar um chimarrão agora. Pelo jeito já são seis horas.
- Com a erva que a gente tem, acho melhor deixar o mate para quando o dia amanhecer.

Josué Guimarães, Enquanto a Noite não Chega, Capítulo 1.

3 comentarios:

Anónimo dijo...

La página está perfectamente escrita por Guimaraes y perfectamente elegida para la ocasión, por Felipe.
Por varias razones me ha hecho reir.

Felipe Martini dijo...

cuáles?

Anónimo dijo...

Porque la escena está tan bien escrita que es como si estuviera viendo esa pareja de viejos.
Porque conozco bien la situación de poner la yerba al sol.Nunca lo hice pero si me faltara yerba y plata, , lo haría.-
Porque sé lo que es deshacer prendas de lana y volverlas a hacer.
Porque conozco gente que repite los cuentos hasta el cansancio . Por las dudas yo siempre pregunto ¿ya te lo conté?.
Finalmente, creo que vos ,Felipe, me ves así, ja, ja, ja
Ojalá me alcance la vida para tener 68 años de casada.A vos te parecerá un horror, pero me gusta conservar mi pareja por tantos años.Eso sí, no creo que me olvide del lugar exacto dónde me casé.

Resumen: me encantó el mate riograndense y ya aprendí muchas cosas sobre Guimaraes,("flor de tipo", como dicen acá)
saludos materos